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The Mandalorian se aprofunda na mitologia de Star Wars em segunda temporada feita para os fãs

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Nova temporada de The Mandalorian que chegou ao fim na última sexta deu vários agrados aos fãs trazendo personagens querido e jogando a série de cabeça no emaranhado cronológico da saga

Por Marcelo Silva

Se já não fosse sabido que a segunda temporada de “The Mandalorian” começou a ser filmada logo que a primeira estreou, daria para desconfiar que a recepção do último Star Wars nos cinemas teve alguma relação com os acontecimentos dos últimos oito episódios da série, que vinham sendo lançados semanalmente no Disney+ desde o final de outubro.

Isso porque “A Ascensão Skywalker” foi um tapa na cara dos fãs, a conclusão de uma trilogia caótica, comandada por pessoas de visões completamente diferentes e sem um fio narrativo coerente. Muita gente desistiu de vez da franquia e tantos outros esfriaram para qualquer novidade relacionado a ela. 

Um pouco antes da estreia do filme porém, veio “The Mandalorian”. Passada cinco anos após os eventos de “O Retorno de Jedi”, a série tinha uma proposta totalmente diferente de tudo que já havia sido feito em Star Wars até então, um western espacial focado num caçador de recompensas. E a primeira temporada cumpriu essa promessa: a história fugia de tudo minimamente relacionado ao drama dos Skywalker, os personagens mal falavam sobre eventos dos filmes e a simples menção da palavra “jedi” foi tratada como um dos grandes momentos da temporada. Apesar de ser melhor aproveitada por fãs, “The Mandalorian” também podia funcionar perfeitamente para quem não conhecia tanto o universo Star War, até agora.

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Talvez fosse mesmo um caminho inevitável, talvez houvessem maneiras diferentes de trilhá-los, mas a verdade é que a missão de levar Baby Yoda (não trabalharemos com o nome real dele aqui por enquanto) para os jedi acabou levando a série para um mergulho profundo na mitologia da franquia, de tal forma que dificilmente quem não é muito familiarizado com ela deve ter conseguido acompanhar tudo que aconteceu.

Por outro lado, é de se pensar que se depois da primeira temporada a pessoa ainda não teve interesse de assistir mais nada de Star Wars não tinha muito mais o que a série pudesse fazer, já que no fim das contas, a intenção sempre foi essa. 

Porque a verdade é que era um pouco inocente acreditar que uma franquia que criou o conceito de produtos licenciados que conhecemos hoje realmente ia fazer uma história totalmente separada de tudo e focando unicamente no storytelling e valor artístico. Com Star Wars, sempre vai haver um equilíbrio tênue entre a arte e o produto, não só brinquedos, mas novas histórias mesmo. Antes da Disney comprar a LucasFilm, já existiam uma infinidade de livros e HQs da saga, desde a trilogia original. 

The Mandalorian Star Wars Disney+
imagem reprodução / The Mandalorian / Disney+

Por isso, para mim não foi exatamente um choque perceber que agora, “The Mandalorian” deixou claro a que veio. E é aqui que entramos no inevitável terreno dos spoilers, então se você não assistiu a temporada ainda, fica o aviso que daqui em diante, vou falar de alguns detalhes dos oito últimos episódios. 

Se no primeiro ano, Mando quase sempre se envolvia em situações meio que “por acidente” e acabava unindo o útil ao agradável, no segundo a fórmula é sempre a de troca de favores, e é repetida a exaustão. Ele precisa de uma coisa, indicam alguém, ele conhece a pessoa e ela diz que só faz X se Mando fizer Y, ele cumpre a missão, a pessoa dá o que ele precisa mas cria uma nova necessidade que ele só pode resolver com outro indivíduo e aí o ciclo se repete. Não é como se essa limitação tivesse sido inventada aqui, séries médicas e policiais costumam ter uma fórmula pronta também, mas nesse caso, com tudo envolvendo uma única missão que era entregar Baby Yoda, foi difícil não revirar os olhos lá pelo quarto episódio quando ficou óbvio que íamos entrar na mesma estrutura novamente.

As coisas ganharam novo fôlego do meio pro final, porque a estrutura repetitiva é compensada pela chegada de rostos conhecidos na mitologia. Primeiro, Bo Katan, uma mandaloriana apresentada na animação Clone Wars (e interpretada aqui por Katee Sackhoff) e então, uma favorita dos fãs também vinda das animações: Ahsoka Tano, trazida à vida por Rosario Dawson, no que é provavelmente o casting mais perfeito de um personagem conhecido nessa saga desde Ewan McGregor como Obi-Wan. Por fim, o criador da série Jon Favreau resolveu dar uma última forçada de barra e “recanonizou” a sobrevivência de Boba Fett (vivido por Temuera Morrison, que foi Jango Fett nos prequels). 

O resultado foi uma segunda metade da temporada que pesou a mão na ação – com direito inclusive a um episódio que foi basicamente um tiroteio de 30 minutos – respondeu algumas grandes perguntas (Grogu, o nome do Baby Yoda! E um pouco de sua origem) e não poupou esforços na entrega do fanservice, mesmo se eles não tivessem tanta substância no fim das contas. 

A grande promessa do final da temporada foi o surgimento do jedi que levaria Grogu para ser treinado e parecia apropriado que uma temporada que conectou Mando a tantos personagens famosos, chegasse ao fim com o maior nome de todos. Luke Skywalker vem, quase como uma divindade, destruindo robôs sem esforço, num massacre provavelmente inspirado na catártica cena com seu pai Darth Vader em “Rogue One”. Quando tira o capuz, é difícil para qualquer um mais apegado à saga não abrir um largo sorriso. E para completar, ainda traz R2D2 com ele. É uma cena para fazer todo fã lacrimejar e sair gritando aos quatro ventos o quanto ama Star Wars (como realmente aconteceu) então o ideal é não ficar pensando demais nela. 

Melhor não pensar em como “The Mandalorian” apresentou vários novos personagens fascinantes e poderia facilmente introduzir um jedi nesse season finale, mantendo Luke apenas como uma menção, aumentando o impacto de sua existência e antecipando um novo personagem para a temporada seguinte (não espere que Luke volte a aparecer tão cedo), melhor não pensar também que enquanto Ahsoka e Boba Fett foram contextualizados para o protagonista e portanto tiveram participações substanciais, Luke surgiu só como um jedi aleatório e o poder do momento é só uma piscada para o espectador. E não vamos refletir muito sobre a volta que a série deu para terminar exatamente… com “o retorno do jedi”.

Não estou sendo irônico: não é para pensar nessas coisas porque não era esse o ponto de Favreau e Dave Filoni (produtor-executivo da série e criador das animações). Eles entendem exatamente o que os fãs de Star Wars querem no fim das contas e é por isso que “The Mandalorian” foi tão bem-sucedida em comparação a nova trilogia: pode até apresentar personagens e ideias novas, mas o negócio é ver os personagens que amamos aparecendo em histórias que não esperávamos como lendas. Que venha Vader massacrando rebeldes, Luke destruindo stormtroopers, Yoda lutando com sabre, Darth Maul aparecendo no filme do Han Solo. Quem ousou fazer qualquer coisa fora dessa bolha (pobre Rian Johnson) recebeu a ira da fanbase. 

E se você está achando agora que eu odiei a aparição de Luke, a verdade é que logo que a X-Wing apareceu no episódio meu olho brilhou. Chorei e bati palma a sequência inteira, terminei o episódio em estado de graça. Porque Star Wars no fim das contas é isso mesmo: é uma das franquias mais bem-sucedidas da história do cinema não exatamente porque tem uma trama complexa, profunda e revolucionária de ficção científica. O sucesso vem pela fantasia com mocinhos e vilões em batalhas emocionantes, é uma saga criada para despertar nossa inocência interior, com a emoção do bem triunfando sobre o mal e personagens cativantes conquistando nosso imaginário e nos fazendo celebrar quando aparecem em cena. 

No fim das contas, “The Mandalorian” parece ter provado que de uma forma ou de outra, Star Wars sempre vai se ancorar em um pouco de nostalgia e na auto-referência. O ideal nesse caso é só ser um pouco mais Favreau/Filoni, que entendem o que os fãs gostam e entregam embalado numa história divertida e cativante o suficiente para que o fanservice tenha algum peso, e um pouco menos J.J. Abrams, que quando não se resume a refazer filmes antigos de ponta a ponta, só joga referências desesperadas na cara do espectador, com resultados completamente vazios. 

Agora é difícil antecipar o que virá na terceira temporada. Voltaremos a ver Grogu? Mando partirá numa missão completamente nova? Podemos esperar por mais personagens antigos? A única certeza que temos agora é que nesse momento, não existe nada em Star Wars mais empolgante que “The Mandalorian”.

Marcelo Silva, colunista de Cultura

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